sábado, dezembro 27, 2003
não venhas tarde
Pela primeira vez comprei uma agenda. Uma bela agenda Taschen com reproduções de Dali. Tão bonita que me faz desejar que o ano comece rápido para, pela primeira vez desde 5 de agosto de 77, ter a ilusão de que a minha vida está organizada. Mas a espera mata-me. É que comprei a dita cuja em Junho, pensando que era 2003/2004, e tenho-a na mesa de cabeceira, a ganhar mofo e humidade dos Açores, desesperando por ser útil, incrédula dos meus propósitos e céptica dos meus objectivos, como aquelas mulheres muito belas, quando percebem que o fim está próximo. LFB
sexta-feira, dezembro 26, 2003
Post pós-natalício II
É no Natal que melhor se compreende como a infância se tornou um lugar de exílio. IFS
quinta-feira, dezembro 25, 2003
sentimental
Mais do que a escrita antiga e trabalhada (por vezes quase barroca, cheia de curvas e adjectivos), são pormenores como este que me fazem vibrar com o último livro de Mário de Carvalho:
"(...) O pastor tirou o cinto, e o coronel, lá ao fundo, pensou para consigo: 'não é que eu seja um sentimental, mas se este tipo me bate na Dores leva um tiro nos cornos'". (p.42) NCS
"(...) O pastor tirou o cinto, e o coronel, lá ao fundo, pensou para consigo: 'não é que eu seja um sentimental, mas se este tipo me bate na Dores leva um tiro nos cornos'". (p.42) NCS
quarta-feira, dezembro 24, 2003
um santo natal ou um natal dos diabos, como queiram
Amigos, desculpem a ausência mas - chegado aos Açores - encontro-me sem net em casa devido a incompetência da Telepac. Enfim, estou a escrever posts para a solidão do meu pc, na tranquilidade inspiradora de Angra do Heroísmo, que o nosso LCA fará o enorme favor de editar depois do Natal.
Vim momentaneamente ao emprego do meu progenitor para pôr a correspondência electrónica em dia e desejar a todos os casadoiros e a todos os que navegam por aqui, umas festas magníficas e tudo de bom.
aquele abraço,
LFB
Vim momentaneamente ao emprego do meu progenitor para pôr a correspondência electrónica em dia e desejar a todos os casadoiros e a todos os que navegam por aqui, umas festas magníficas e tudo de bom.
aquele abraço,
LFB
Conto de Natal
Nesta véspera de Natal, resolvi não esperar pelo senhor das barbas (o outro, que não o ministro Morais Sarmento) e, pela manhã, bem cedo, alegrei o meu dia com uma breve ida ao "Continente". Eu não gosto do "Continente" - prefiro o "Jumbo": mas, como é Natal, resolvi ter um gesto magnânimo e fui ao "Continente".
(As pessoas que se aborrecem de ler estas coisas, da vida real dos bloggers, podem ficar já aqui e poupar-nos dez emails a dizer que o nosso blog só devia ter posts importantes, que valessem a pena, com textos no estilo de meninas púberes deprimidas à janela, pelas madrugadas.)
Queria comprar lenha. Não havia lenha. Só havia pinhas. Comprei pinhas (pinhas de zona demarcada, do concelho de Proença-a-Nova). Isto faz sentido: os hipermercados de Portugal são iguais ao País. Aqui também não há hospitais que funcionem bem, trabalhadores produtivos bem pagos, empresas que invistam em si próprias e nos seus funcionários, etc. Mas toda a gente tem o último telemóvel da moda, janta-se fora por 50 euros, corta-se o cabelo a olhar o rio... Não temos lenha, mas temos pinhas. Então, venham as pinhas. E farei uma lareira de pinhas, que deve ser a última moda londrina, o que significa que, para a semana, já Lisboa inteira arderá em pinhas.
O "Continente" estava o que se espera - um desespero. Nos breves minutos em que lá estive, ainda consegui assistir ao espancamento de uma criancinha irritante, pela mãe. Vi gente a gastar 300 euros em garrafas de sumo (que diziam ter 13 por cento do dito) e coca-colas - trezentos euros que dão para cerca de 550 quilogramas de laranjas. Vi duas jovens senhoras entusiasmadas a comprar pilhas, discutindo tamanhos e adequações. E ainda tive tempo para reparar que a comida da Celeste, gata, ali custava mais dois euros que no sítio do costume. À saída, tive mais um gesto natalício, ao aceitar duas moedas de vinte e uma de dez, a troco do meu carrinho, já competentemente inflado da certeira moeda de cinquenta cêntimos.
Agora, três da tarde, tenho caixotes para encher de livros (mudança de casa oblige) e exames para corrigir. Fazer tempo, no fundo. Como toda a gente sabe, o que interessa são as prendas, mais à noite. Porque isto de comer bacalhau cozido e couves é um sofrimento, certo? O Natal devia ter chocapic e caipiroskas, e não peixe cozido, tal como em vez de sonhos fritos, a mesa devia estar cheia de vales da FNAC. Pretensioso? Quem ficar desgostoso com a troca, que atire a primeira pedra. Mas não atire já - espere pela meia-noite de amanhã, quando tudo volta a ser como ontem, e as pedras podem voar outra vez. MR
(As pessoas que se aborrecem de ler estas coisas, da vida real dos bloggers, podem ficar já aqui e poupar-nos dez emails a dizer que o nosso blog só devia ter posts importantes, que valessem a pena, com textos no estilo de meninas púberes deprimidas à janela, pelas madrugadas.)
Queria comprar lenha. Não havia lenha. Só havia pinhas. Comprei pinhas (pinhas de zona demarcada, do concelho de Proença-a-Nova). Isto faz sentido: os hipermercados de Portugal são iguais ao País. Aqui também não há hospitais que funcionem bem, trabalhadores produtivos bem pagos, empresas que invistam em si próprias e nos seus funcionários, etc. Mas toda a gente tem o último telemóvel da moda, janta-se fora por 50 euros, corta-se o cabelo a olhar o rio... Não temos lenha, mas temos pinhas. Então, venham as pinhas. E farei uma lareira de pinhas, que deve ser a última moda londrina, o que significa que, para a semana, já Lisboa inteira arderá em pinhas.
O "Continente" estava o que se espera - um desespero. Nos breves minutos em que lá estive, ainda consegui assistir ao espancamento de uma criancinha irritante, pela mãe. Vi gente a gastar 300 euros em garrafas de sumo (que diziam ter 13 por cento do dito) e coca-colas - trezentos euros que dão para cerca de 550 quilogramas de laranjas. Vi duas jovens senhoras entusiasmadas a comprar pilhas, discutindo tamanhos e adequações. E ainda tive tempo para reparar que a comida da Celeste, gata, ali custava mais dois euros que no sítio do costume. À saída, tive mais um gesto natalício, ao aceitar duas moedas de vinte e uma de dez, a troco do meu carrinho, já competentemente inflado da certeira moeda de cinquenta cêntimos.
Agora, três da tarde, tenho caixotes para encher de livros (mudança de casa oblige) e exames para corrigir. Fazer tempo, no fundo. Como toda a gente sabe, o que interessa são as prendas, mais à noite. Porque isto de comer bacalhau cozido e couves é um sofrimento, certo? O Natal devia ter chocapic e caipiroskas, e não peixe cozido, tal como em vez de sonhos fritos, a mesa devia estar cheia de vales da FNAC. Pretensioso? Quem ficar desgostoso com a troca, que atire a primeira pedra. Mas não atire já - espere pela meia-noite de amanhã, quando tudo volta a ser como ontem, e as pedras podem voar outra vez. MR
terça-feira, dezembro 23, 2003
Post pós-natalício
Daqui a dois dias vai ser como assim foi:
DE UM CONGRESSO DE MIGALHAS
«- Ao grande torneio mandibular que os nossos antepassados introduziram no seu sistema de sobrevivência, com o correr sempre indiferente dos anos, sucedeu este pequeno jogo de migalhas, migalhas de tudo, que ficará como a forma típica do convívio neste tempo. Posto isto, resta-me anunciar, melancolicamente, a abertura do novo ESTÁBULO-VALA COMUM e, para compensação, o crescimento, ainda que trémulo e incerto, do mito das CABEÇAS LIMPAS...
(Vivíssimos aplausos)»
(Alexandre O'Neill; sublinhados nossos) IFS
DE UM CONGRESSO DE MIGALHAS
«- Ao grande torneio mandibular que os nossos antepassados introduziram no seu sistema de sobrevivência, com o correr sempre indiferente dos anos, sucedeu este pequeno jogo de migalhas, migalhas de tudo, que ficará como a forma típica do convívio neste tempo. Posto isto, resta-me anunciar, melancolicamente, a abertura do novo ESTÁBULO-VALA COMUM e, para compensação, o crescimento, ainda que trémulo e incerto, do mito das CABEÇAS LIMPAS...
(Vivíssimos aplausos)»
(Alexandre O'Neill; sublinhados nossos) IFS
domingo, dezembro 21, 2003
change blog
Aparentemente, a blogosfera já se faz de algumas regras costumeiras como a de que não se deve apagar ou modificar um post já editado. Mea culpa. Acabei de o fazer, e logo com dois. Explico: estava a editar dois posts de leitores, convencido de que o fazia no blog vizinho deste... Enganei-me. Durante 5 minutos o DC apresentou dois textos de premiados no concurso para bilhetes do Stand-Up Tragedy. A mantê-los, teria de concordar com os críticos. Era confusão a mais. Critério, critério... Pelo menos, descobri a função change blog. LFB
et pluribus unum
O meu irmão não levará a mal que publique este seu espantoso texto de boas festas. Serve, já agora, como postal de natal para todos aqueles que navegam pelo DC e como forma de matar saudades do AB. LFB
Ainda a braços com a tempestade que tem sido a recta final de 2003, escrevo este breve mail a todos os amigos que figuram na minha (mais que provavelmente desactualizada) lista de endereços com o propósito de vos desejar um magnífico Natal, que redima todas as coisas más que nos possam ter visitado este ano.
Habituei-me a que o tempo passasse cada vez mais depressa, tão depressa o tempo e tão habituado eu que já não chegasse a lamentar as consequências: que seja fácil haver espaços de meses sem nos vermos, sem falarmos, sem um abraço; a que tivessemos de pôr em dia os factos de períodos intensos e importantes das nossas vidas em sumários telefónicos e electrónicos e, não poucas vezes, ilegíveis siglas e abreviaturas da nomenclatura sms inventada sabe-se lá por quem, sabe-se lá em que lugar. Não poucas vezes, dou por mim, contudo, a lamentar que assim seja, que já não me esforce muito por juntar toda a gente a uma mesma mesa e ficar a falar por horas, naquele registo confessional e quente de fim de refeição. Parece que há sempre alguém que não pode vir e outro alguém que se tem de levantar cedo no dia seguinte porque tem de ir trabalhar, muitas vezes, eu próprio.
Peço-vos desculpa por isso e por todos os factores mais ou menos incontroláveis que nem sempre nos têm permitido falar e estar juntos durante os acontecimentos fundamentais de cada uma das nossas vidas. E, sabendo de antemão da fragilidade destas resoluções de ano novo, deixo-vos, na mesma, a minha, extensível a todos nós, se estiverem nessa disposição: que aprendamos, cada vez mais, o valor do tempo e percebamos que grande parte da nossa felicidade e realização depende dos bons momentos que passamos à conversa, nos copos, em viagem, na estrada, na praia, um pouco por toda a parte, muito, muito para além do trabalho e de uma corrida solitária, frequentemente, sem fim à vista.
Assim, e evitando, desde já, o habitual caos de mensagens escritas dos dias 24 e 25, aceitem os meus votos de um Natal verdadeiro que, como todos os bons natais, nos faça sentir do tamanho físico e mental de uma criança de 5 anos feliz por ser pequena.
Um grande abraço!
Alexandre Borges
Ainda a braços com a tempestade que tem sido a recta final de 2003, escrevo este breve mail a todos os amigos que figuram na minha (mais que provavelmente desactualizada) lista de endereços com o propósito de vos desejar um magnífico Natal, que redima todas as coisas más que nos possam ter visitado este ano.
Habituei-me a que o tempo passasse cada vez mais depressa, tão depressa o tempo e tão habituado eu que já não chegasse a lamentar as consequências: que seja fácil haver espaços de meses sem nos vermos, sem falarmos, sem um abraço; a que tivessemos de pôr em dia os factos de períodos intensos e importantes das nossas vidas em sumários telefónicos e electrónicos e, não poucas vezes, ilegíveis siglas e abreviaturas da nomenclatura sms inventada sabe-se lá por quem, sabe-se lá em que lugar. Não poucas vezes, dou por mim, contudo, a lamentar que assim seja, que já não me esforce muito por juntar toda a gente a uma mesma mesa e ficar a falar por horas, naquele registo confessional e quente de fim de refeição. Parece que há sempre alguém que não pode vir e outro alguém que se tem de levantar cedo no dia seguinte porque tem de ir trabalhar, muitas vezes, eu próprio.
Peço-vos desculpa por isso e por todos os factores mais ou menos incontroláveis que nem sempre nos têm permitido falar e estar juntos durante os acontecimentos fundamentais de cada uma das nossas vidas. E, sabendo de antemão da fragilidade destas resoluções de ano novo, deixo-vos, na mesma, a minha, extensível a todos nós, se estiverem nessa disposição: que aprendamos, cada vez mais, o valor do tempo e percebamos que grande parte da nossa felicidade e realização depende dos bons momentos que passamos à conversa, nos copos, em viagem, na estrada, na praia, um pouco por toda a parte, muito, muito para além do trabalho e de uma corrida solitária, frequentemente, sem fim à vista.
Assim, e evitando, desde já, o habitual caos de mensagens escritas dos dias 24 e 25, aceitem os meus votos de um Natal verdadeiro que, como todos os bons natais, nos faça sentir do tamanho físico e mental de uma criança de 5 anos feliz por ser pequena.
Um grande abraço!
Alexandre Borges