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sábado, agosto 23, 2003

conversa entre duas amigas numa discoteca: 

Boa – Não vais acreditar no que ele me disse!

Feia – Então?

Boa – Imagine que sussurrou-me ao ouvido que eu era “boa como o milho”!

Feia – Não!

Boa – Sim! Já imaginaste o que é seres comparada a uma fruta?!

Feia - ... Cereal.

Boa – O quê?

Feia – Nada, nada...

Boa – Os homens são incríveis.

Feia – Machistas, não é?

Boa – Nojentos.

Feia– Uns cabrões.

Boa (mudando subitamente de assunto) – É verdade! Então e o teu namorado?

Feia– É tão fofo!

Boa – Lindo! Como é que vocês se conheceram?
LFB

ps: os politicamente correctos poderão substituir "Boa" por: jovem senhora abençoada pelas graças da natureza; e "Feia" por: rapariga portadora de beleza alternativa e encanto interior.

neura de sábado à tarde 

Quando sinto que não há nada para fazer começo a deprimir-me. E é certo que o deus sádico da televisão contribui muito para isso: basta ligar e ver, com um aperto no peito, que já não vou a tempo de aprender a fazer as assistências do Deco, nem as verdadeiras obras de arte do pé esquerdo de Hugo Viana. Nem muito menos tocar guitarra como o Lenny Kravitz. Na adolescência, a minha louvável – ou, pelo menos, adorável – estupidez natural, dizia-me que tudo era possível. Agora chegámos à idade da especialização. O pior, meu bom e velho amaricado Sócrates, é que acredito em ti no “Só sei que nada sei”. Para o bem e para o mal, há tiradas como a da personagem de Brad Pitt, no “FIGHT CLUB” de David Fincher, dirigindo-se aos anónimos membros do clube: “Mentiram-vos. Nunca serão pop stars”. Suprema ironia a de Fincher ao colocar esta frase na boca de quem a diz... A vida, meu querido DC, é cruel. Sem tirar nem pôr. Mais vale deixar-me de neuras e ir dormir a sesta e sonhar com o Euro.
Além disso, quando o Figo marcar o primeiro golaço, hão-de haver 10 milhões de pés dentro daquela chuteira – e prometo que o meu será de todos o mais confortável. LFB

sexta-feira, agosto 22, 2003

Medos de um conservador  

O Acho Eu , voltando ao tema do conservadorismo, vem sugerir-me a leitura de Oakeshott. Agradeço a sugestão e o esclarecimento. Mas mesmo antes de me melhor preparar e valer da autoridade dos teorizadores, lançava aqui um verso de um poema de Yeats, que diz tudo sobre a essência de um conservador: “I sing what was lost and dread what was won” (Canto o que perdi e temo o que foi ganho). Ou uma outra frase: “to fail again, to fail better”. Em ambas se vê a obsessão do conservador, a possibilidade de falhar. O medo de falhar. Concordo que as âncoras, as raízes, aquilo que deu provas e resistiu ao tempo apaziguem o falhanço que faz parte da vida, que a memória apazigue o fracasso- outra das obsessões conservadoras- mas se é possível discordar de um sentimento, discordo desse de quase nada valer a pena porque, no final, se sairá sempre derrotado. Espreita, aí, o perigo da inércia.
Diz, ainda, o Acho Eu que “ tem medo, sincero medo, dos que mudam o mundo por causa da razão, da sua razão”. Parece-me que entre os que querem mudar o mundo pela razão e os que querem que ele permaneça igual a si mesmo, há um meio termo. O meio termo dos que não se entusiasmam com a mudança mas também não lhe resistem, se ela se impõe. Não é passividade, é apenas o jogo saudável que a natureza nos ensinou, de adaptação ao meio, de flexibilidade, de fazermos das desvantagens e contingências nossas aliadas. Porque é que há-de ser melhor o que se perdeu do que o que está para vir? Porque o que se perdeu deu provas e o que se ganhou ainda não as deu? Se fossemos eternos, essa questão não se punha. Termina o achoeu “leia o Oakeshott e vai descobrir que ser conservador é muito mais uma questão de familiaridade com o presente - mesmo com o seu lado negro - do que uma tese absolutista sobre as virtudes do passado”. Pois, a mim parece-me que o conservador só se familiariza com esse lado negro do presente e não com o seu lado resplandecente. Mas estou, como dizia, no domínio do empirismo.
CMC

Um Animal Hamletianino 

No Blogue dos Marretas leio o seguinte;
OUTRO CONSELHO GRATUITO (Para quem aprecia o silêncio)
Frequentem apenas estâncias turísticas, hotéis e parques de campismo que interditem a entrada de italianos.
ANIMAL.


Hoje de manhã das 8 ás 10H, caro Animal, chegado de Itália há pouco, tentei escapar à imbecilidade das obras dos vizinhos (Portugueses) refugiando-me na praia de Leça com o Cervantes (calma, nada relacionado com meu post anterior). O Ricardo Sampaio já aqui falou da imbecilidade dos Portugueses na praia, hoje pude constatar o triste nascimento em mim de uma vergonha por este refugo de imbecis e adiantar, ansioso, a papelada para me casar com a Laura e ser assim, também, Italiano. É que, meu caríssimo Animal, eu como pressuponho você também, sofro de acicatada sensibilidade auditiva e qualquer som, por menor que seja, me incomoda, imagine você a indigência constante de ter que aturar os portugueses ao telemóvel, ou no avião, ou no restaurante, ou no cinema, ou no teatro, enfim, sempre aos ululos a querer mostrar o impossível: a improdução deste País (Estes ululos atravessam oblíquamente a sociedade Portuguesa, do humilde sapateiro à arrogante intelectual e é precisamente aqui, meu amigo, que a medíocridade deste País se revela, na pequenez e no provincianismo das classes supostas doutas).
Os Italianos pelo menos têm pela vida um afecto, um fulgor e uma capacidade de fazer (em vez de comentar) que me assombra. Já para não falar das Italianas...(que se passa consigo?) Aquele abraço a si e ao Statler (belo post, sobre ler os amigos que escrevem).
E o resto, caro amigo, é silêncio. BR

A Urgência da Fala 

Recebi há segundos SMS curioso;
De:+35191xxxxxxx
AMO TE FALA
URGENTE (nome de Homem)
BEIJO

Não fora eu assolado por esta loucura que é um profundo encanto pelas mulheres e falar-lhe-ia, com urgência, apesar de não o conhecer.
O que me levanta a seguinte preplexão; Nesta Solilóquiolandia ainda não li uma linha sequer, uma confissão, um cibernético papiro ou devaneio sobre a homossexualidade. Ou terei percebido mal e só me quis informar, com suspeito beijo pelo meio, do seu amor pela fala urgente, ou uma urgência de falar? BR

ps- Sei agora quem me enviou este sms. Agradeço e vindo de quem vem só me enaltece... Gostaria de ver discutido neste frenesim dos blogs este assunto, o Amor entre os Homens e o Amor entre as Mulheres.
É que grande parte das meninas e dos meninos passam as tardes e as noites a citar nos seus blogs, entre elucubrações do inútil e malabarismos conservadores, autores Homossexuais.

LUX AMERICANA 

Em Nova Iorque, um gigantesco blackout que podia ter-se revelado um desastre nacional, foi afinal uma festa de rua que revelou a fraternidade e o bom humor dos habitantes da Big Apple. Até já se fazem T-shirts a comemorar a efeméride, dando-lhe honras de vitória da humanidade sobre as trevas.
Eu percebo a emoção dos nova-iorquinos, mas não a dos portugueses. Na imprensa e na blogosfera, até mesmo neste blog, sucedem-se os comentários comovidos sobre o fenómeno dos habitantes de Nova Iorque terem vindo para as ruas conviver e passar as horas de escuridão em companhia dos seus conterrâneos. Pessoalmente, não acho que tenha sido nada de especial. Especiais são os portugueses. Há séculos que vivemos num país em blackout e, apesar da tremenda escuridão, não nos damos nada mal uns com os outros.TR

A Arte De Ser Português* 

Dia sim, dia não, ouvimos alguém citar Almada Negreiros ou Eça de Queiroz ou Padre António Vieira e transpor frases e ideias suas para o nosso tempo. Enquanto não enjoamos o truque, vamos achando brilhante a aplicação das palavras de outras épocas à nossa própria e, conforme admiramos a cultura daquele que cita, surpreendemo-nos, uma vez mais, com o génio visionário dos nossos maiores escritores.
Que me perdoem, no entanto, todos os amantes dos sermões e das farpas e dos ultimatuns, mas não se trata de escrever frases eternas nem de prever como seriam os portugueses de meio século, um século, dois séculos depois; trata-se, pura e simplesmente, do contrário: não é que Almada, Eça e Vieira fossem visionários, os portugueses é que estão na mesma.
AB

* Este título foi gentilmente cedido por Teixeira de Pascoaes. “Compre nas livrarias Teixeira de Pascoaes! Se não houver agora, para o ano há mais!”

Se virem o gajo dêem-lhe um biqueiro por mim! 

O meu ideal de vida seria ganhá-la como actor/argumentista. Admiro, pois, os poucos heróis que o conseguiram. Uma lista pequena que vai de Woody Allen a Sam Shepard. Algures entre estes nomes está um senhor chamado Edward Burns que procuro - carinhosamente - odiar sempre que posso. Achei-o canastrão em "Saving Private Ryan", pintas em "15 Minutes", e fui apagando da memória os prémios que ganhou em Sundance com os seus filmes como actor, argumentista e, como se ainda não bastasse, realizador.
Sucede que acabei de ver "Histórias de Nova York", o seu tour de force. Ocorrem-me duas palavrinhas: F%&X-#$, e "P@?#!
Não só o filme é óptimo como este cabrão com pinta de modelo Hugo Boss também vai às mil maravilhas. Cereja no topo do bolo: o gajo já trocou fluidos com Lauren Holly e Heather Graham entre outros exemplares deluxe da criação. São coisas destas que me aproximam do ateísmo. LFB

informação perfeitamente fundamental para a vossa felicidade futura 

O flamenco é o único tipo de espectáculo em que - mesmo que o público deteste - haverá sempre palmas. LFB

O Bom Selvagem 

Vale a pena publicitar um blog quando o mail promocional tem piada. Cá vai ele:



Caros sofregos noivos,

Depois de ler cuidadosamente a vossa lista de links para Blogs fiquei admirado do meu Tasca da Cultura não figurar ali entre tão humilde selecção.

Admito que, sendo o meu blog bastante jovem (tem um dia), ainda não tiveram tempo de introduzir o link.

Quando o fizererem, eu introduzo um link para o vosso blog no meu blog. Olhem que ficam a ganhar com a troca amigos. Poderiam depois dizer que foram pioneiros no reconhecimento daquele que será o Facho da cultura lusitana: A Tasca da Cultura.
Se quiserem mesmo casar não terão dificuldades em 'engatar' uma fêmea no Bairro Alto, podem até imprimir este mail, vão ver que daqui a uns tempos impressionarão essas babuinas com a prova de que eu me dignei a dirigir-vos a palavra! ;)

Espero não levarem a mal esta familiaridade, mas acho que nós, apreciadores da boa cultura, temos uma empatia inata, um pouco como os homossexuais conseguem sempre farejar ouro da mesma espécie.

Continuem com o bom trabalho pá,
-uma sonora palmada nas costas-

O Bom Selvagem

Do Pico para as Furnas, com breve paragem no Livramento 

Passo aqui pelo blog, acabado de chegar da ilha do Pico. Amanhã à tarde parto para as Furnas - uma espécie de ilha de silêncio e de memória aqui mesmo no interior do verde de São Miguel. Do Pico podia contar muita coisa - podia relembrar a vista para São Jorge, das adegas onde ficámos alojados no início. Podia recordar a alegria do primeiro banho, nas águas limpas do porto da Prainha. Podia elogiar a sobriedade e o cuidado do Museu dos Baleeiros, nas Lajes, e registar os nomes de alguns homens que estiveram ligados à caça à baleia e que ali são homenageados, como Manuel Joaquim Machado (mestre de lancha), José Pimentel de Melo (baleeiro) e Gusmercindo Machado Medina (trancador). Podia, em alternativa, transmitir a sensação de ver um grande cachalote no meio do mar, lançando a sua respiração para uma lancha de borracha, ou então trazer para esta mesa algumas das cracas e dos cavacos que tivemos a sorte de ter à frente e voltar a comprar umas rifas numa pequena loja armada por alturas das festas de São Roque. Podia escrever sobre tudo isso e até sobre a simpatia do João e da Monique, os anfitriões do "L' Escale de L' Atlantique", mas prefiro recordar um passeio até à casa do Dias de Melo, amigo e mestre - e "escritor baleeiro", para usar a expressão da placa de uma rua do Pico. Saímos a pé do Calhau e parámos para o almoço na Piedade, num restaurante chamado "Sonhos Bar" que, talvez por isso mesmo, tinha colado no vidro um anúncio que prometia a "Cabo TV através de um Serviço Digital por Satélite". Descemos depois até à Calheta de Nesquim por estreitos caminhos ladeados por antigas habitações de pedra e por algumas casas novas com famílias a viver lá dentro, mas ainda por pintar. Por cima de nós, um tecto de nuvens cinzentas era empurrado pelo vento da ponta Este da ilha. Em casa do Dias de Melo, erguemos para um brinde os nossos copos de angelica caseira e, sobre o mar, no "Alto da Rocha do Canto da Baía", ouvimos algumas antigas histórias da Calheta, alumiadas por azeite de baleia. NCS

quinta-feira, agosto 21, 2003

REVISITAÇÃO DE “PEDRO E O LOBO” 

Em conversas várias surpreendo-me rodeado de superlativos: recomendam-me filmes “excelentes”, restaurantes “fantásticos”, livros “geniais”, canções “fabulosas”.

Vou então ver esses filmes, vou ler esses livros: são com frequência objectos estimáveis, quase sempre correctos, por vezes notáveis; mas rarissimamente sobrevivem à mudança de estação e ao surgimento de outros filmes “magníficos”, de outros livros “brilhantes”.

Assim sucede tristemente que os superlativos por aí andam sem mesura, nas bocas de todos, ao deus-dará.

Ora eu tenho para mim que os superlativos deveriam ser estimados como os mais preciosos exemplares desse guarda jóias que é a língua portuguesa.

Os superlativos são como uma tiara de diamantes, como uma gargantilha cravejada de esmeraldas, que as senhoras sempre conservam a bom recato num cofre de um banco da Baixa lisboeta, e que mandam buscar somente para comparecer no casamento dos Duques de Bragança, ou coisa assim. Uma, duas vezes na vida.

Dizer de um filme simpático, mas apenas correcto, que é “fan-tás-ti-co” é como colocar a tiara todos os dias para ir à mercearia comprar batata-doce, feijão encarnado, óleo Fula: além de fazer de nós uns pindéricos irremediáveis, esse continuado abuso acaba por retirar à tiara todo o brilho, todo o chique, todo o efeito.

É que a excelência acontece; apenas não cresce nas árvores. Mas se por tudo e por nada gritamos “excelente!”, “esplêndido”, “brilhante!”, ninguém já nos escutará, ainda que, por uma vez, tenhamos razão.

Isso é sujeitar as coisas verdadeiramente muito boas a um desprestígio lúgubre; o que é de uma melancólica tristeza, como hão-de concordar. LDA

Sina de filha 

Gosto deste autor Cootzee. Leio em “Desgraça”:
“ Na realidade o que pretende ele para Lucy? Não que ela permanecesse para sempre criança, para sempre inocente, para sempre sua- isso não, de certeza. Mas ele é pai, é esse o seu fado e, à medida que um pai envelhece- não pode evitá-lo- aproxima-se cada vez mais da sua filha. Ela torna-se a sua segunda salvação, a noiva da sua juventude renascida... Suspira. Pobre Lucy! Pobres filhas! Que destino, que fardo a carregar!” CMC

O meu primeiro post em nome da equipa! 

Acabo de saber a notícia pelo Aviz . O mínimo que o Desejo Casar pode fazer é, primeiro, ficar feliz (rima involuntária), segundo, saudar a entrada de Ana Sá Lopes na blogosfera. O Glória Fácil conseguiu um magnífico negócio. Melhor que o Benfica com o Luisão.
Seja muito bem-vinda, Ana!
AB

Got a light? 

Continuo a adiar o sonho de Nova Iorque. A esperar o dia perfeito para lá ir. Ou o ímpeto de loucura para me mudar, definitivamente, fazendo-me surdo ao provável mau gosto do lugar-comum. A queda das torres fez-me perceber o erro da demora, alertou-me para a possibilidade de os lugares não permanecerem perfeitos, à nossa espera.
Entretanto, se a proibição do fumo nos recintos públicos fechados me afastou, um pouco, o desejo, o recente apagão veio, ironicamente, reacendê-lo. O comportamento mágico dos nova-iorquinos, saindo à rua para, em comunidade, ultrapassar aquelas horas, sem violência nem desordem, antes com civismo e humanidade, é um marco na história das sociedades contemporâneas. Ninguém se esquecerá daquele homem (já distante da idade dos entusiasmos juvenis) que, ao raiar do dia, erguendo-se da escadaria onde dormiam dezenas de pessoas, à pergunta do jornalista sobre como havia sido passar ali aquela noite respondeu: “It was wonderful! I made a lot of new friends.”
Deste lado do Atlântico, continuo à espera dos comentários de todos aqueles que, ao longo dos últimos meses, têm enchido a praça pública com ideias tão bem fundamentadas como a de que os americanos são todos primários, estúpidos e mal formados.
AB

O cinema com V. 

V. foi o meu primeiro amor. O primeiro amor, assim mesmo, longo, tímido, platónico, como num filme americano. Um teen movie peculiar em que ele declara-se na biblioteca e foge de casa para ir com ela às aulas de dança. Mas sem final feliz.
Anos depois, eu e V. encontramo-nos. Ela deixou o namorado. Numa noite qualquer, sem que nada o fizesse prever, amamo-nos uma só vez, arrependemo-nos e separamo-nos, como num filme francês.
Mais anos passam. Hoje encontro V. - regressou ao namorado, casou há um ano, pensa em divorciar-se. Nada resta daquela jovialidade antiga, daquele sorriso luminoso que transformava um rosto banal no mais belo que já vira. Não sei que lhe dizer. Ficamos num longo silêncio, imóveis e distantes, como num filme português. LFB

dança da juventude 

Vê-se pela hora deste post. Cheguei agora de uma discoteca. Sem ar condicionado. Poupo-vos a descrições pornográficas. Basta a palavra "suado". 500 pessoas dançam durante horas, dançam de olhos fechados. Sorriem a desconhecidos que respondem sem que ambos se vejam.
Dançamos porque não se pensa enquanto se dança. Dançamos contra o tempo, contra o minuto seguinte, contra a certeza de que voltaremos a pensar e o tempo passará. Acendem-se cigarros para celebrar a paragem dos ponteiros. A dança é a única manifestação colectiva onde não existe Deus ou a sua antítese. É por isso a única manifestação colectiva verdadeiramente humana. E, se o tempo pára, o que faz isso de nós? LFB

A imunidade de um conservador  

Há tempos escrevi aqui um post intitulado “o conservador é um sentimental” mas depois de ler um belo poema” used words”, transcrito pela flor de obsessão, onde estão patentes as obsessões de um conservador, gostaria de acrescentar que o conservador é um defensivo, de tal modo couraçado por detrás de certezas e antídotos que impede que a vida lhe pregue surpresas, alegrias ou mágoas.
Antes de elas chegarem já ele mentalmente, intelectualmente, anulou o efeito de qualquer emoção e, assim, julga libertar-se dos golpes do acaso.
Mas ele apenas desvalorizou o presente e as ofertas da vida. CMC

quarta-feira, agosto 20, 2003

O Mapa dos Sonhos 

A páginas tantas, a entrecortar o silêncio das curvas montanhosas da Ligúria diz-me (distraída a ver mapas) a Laura, à queima-roupa, uma das frases mais bonitas que já ouvi;
Para sonhar é preciso um mapa, disse a Laura von Dellemann... como pode um homem resistir? BR

É para longe daqui, por favor 

Esta manhã, ao entrar num táxi, logo após indicar o destino, ouvi da boca do motorista um princípio de conversa num tom muito diferente do habitual: “Então, lá morreu outro homem de paz…” Não havendo necessidade de acrescentar o que quer que seja ao que tem sido dito pela imprensa e, também, aqui e ali, gostaria de me ficar apenas pelo som desta frase resignada do taxista de hoje, às 11 horas. Nela se encerra a incompreensão perante a injustiça e a certeza de que há qualquer trauma profundamente edipiano no modo como as civilizações tendem a matar aqueles que se poderiam constituir como seus pais.
Oxalá a própria paz não tenha morrido com o homem.
AB

epitáfio 

Li o post anterior do LFB, a propósito da morte de Sérgio Vieira de Mello, no momento em que tinha nas mãos um livro que comprei num alfarrabista de Lisboa, há já alguns meses e que só agora consigo ver a sério.
De dentro deste livro, que me chega às mãos sem saber por onde passou, caem dois pedaços de jornal. Um deles traz uma data, que alguém escreveu a tinta azul: "sáb., 6-3-1976". O texto nesse papel, ao qual não consigo dar autor porque não passa de um pedaço de jornal rasgado, quase a desfazer-se, chama-me a atenção, porque diz

"Alguns tombaram, é certo, e outros cairão ainda, na passada, em choques ou em voo, antes do seu termo. Poucos serão, relativamente à seiva renovada e fortalecida dos vindouros."

A esperança de Sérgio Vieira de Mello é igual à nossa. Oxalá a mereçamos. MR


Duarte Vaz Pinto 

A morte do diplomata Vieira de Mello recordou-me o único embaixador que conheci, Duarte Vaz Pinto. Duarte era o decano dos embaixadores portugueses quando o cancro chegou. Este homem, que permanecia desde um Portugal fascista, gostava de entreter os amigos da sua filha Mafalda com histórias de embaixadas e consulados. Enredos de espionagem, por vezes, que nunca soavam pomposos e solenes na sua boca. Tudo naquela vida era elegância, cortesia, discrição, sapiência. Vivia acompanhado da sua antiquíssima edição do Dom Quixote, mil vezes relida, e era de uma lucidez e abertura ideológicas inusitadas num homem com o seu passado político.
Aprendi com Duarte Vaz Pinto algumas coisas que, quanto mais tempo passa, menos considero despiciendas: que não se pode julgar o carácter de um homem sem colocar em causa o nosso próprio; que a ironia deve servir-se com boa educação ou é apenas rudeza; que um homem deve ser digno quando o momento o pedir. Ou não é um homem.
Durante o longo período de sofrimento causado pelo câncro nunca vi um esgar na sua expressão. Manteve sempre uma compostura serena e o Cervantes por perto. Recordo o dia em que fui visitá-lo ao hospital, uma semana antes da morte. 25 kgs mais magro, o corpo marcado por inúmeras transfusões de sangue, uma teia de tubos. Duarte teve, mesmo assim, palavras para agradecer o primeiro sangue que dei na vida e a única coisa incomum na sua atitude foi o aperto de mão mais forte, mais prolongado do que alguma vez fora.
Morreu sem uma lágrima, sem pedidos de misericórdia ou indignações para com Deus ou a vida. Foi digno quando o momento lho exigiu. Quiçá a mesma sublime dignidade com que Sérgio Vieira de Mello foi capaz de telefonar enquanto morria debaixo dos escombros.

Uma dignidade que revejo, dezenas de vezes, num curto plano de "Rosemary's Baby", de Polansky, filmado no edifício da ONU - onde Duarte Vaz Pinto servia naquele tempo - em que o pai da Mafalda, com a figura de um verdadeiro Bond, atravessa um corredor, deixando-se imortalizar pela película. Quantos indivíduos, não-actores, terão merecido um plano na história do cinema? Quantos homens, desde sempre, terão partilhado a mesma aura de Vaz Pinto e Vieira de Mello? LFB

Bigger than life 

Sérgio Vieira de Mello morre e três países emocionam-se. Brasil, Portugal e Timor. É o que se chama de uma vida em grande. LFB

Khayyam (II) 

LXXXIII- Em que meditas, amigo? Nos teus antepassados? Pó sobre pó. Na sua glória? Deixa-me sorrir. Toma este cântaro e bebamos, escutando sem temor o grande silêncio do Cosmos.

XC- Pergunto-me sobre o que, na verdade, é meu. Pergunto-me sobre o que ficará de mim depois de morto, a vida passa como um incêndio. Chamas que o alecrim esquece, cinzas espalhadas pelo vento, tal é a existência humana.

CMC

terça-feira, agosto 19, 2003

Os Cantonas, os Sokotas e os outros 

O debutar de uma nova época futebolística fez-me recordar uma questão antiga: como resistem os jogadores de futebol a todas as agressões e provocações de que são alvo durante um ano inteiro, uma vez por semana, ao longo de 90 minutos consecutivos? Como é que não explodem? Não respondem, pelo menos, na mesma moeda? Naquele instante quente, como são eles capazes de controlar os instintos mais orgânicos e recordar-se dos conselhos do treinador, da mulher, da mãe, do avô? Levam um pontapé, depois um murro, um puxão no cabelo, uma cuspidela e ainda assistem à expressão cândida do agressor perante a passividade do juiz… É de homem! Por isso, entendi sempre os Cantonas todos deste mundo (associação em que não se insere o João Pinto da Coreia, apenas o de Paulinho Santos) e revi-me neles.
No fim-de-semana passado, Sokota apanhou de toda a maneira e feitio e não expressou sequer um esgar que indiciasse a palavra “voutematóvitch” (conceito croata a que equivale, numa tradução selvagem, o nosso “se te apanho a jeito…”). E eu, no sofá, indignava-me, mas admirava-o, recuperado de um ano e tal de muletas, hospitais e ginásios, sem medo, diante da pequenez de indivíduos que a história do desporto jamais se ocupará em recordar.
Agora, se não jogo futebol, tento transportar o exemplo para a vida de todos os dias e aplicá-lo, por exemplo, na blogosfera. Da próxima vez que for provocado, também não responderei. Lembrar-me-ei das palavras de Camacho antes da partida e das do velhote da padaria ao intervalo. E permanecerei na minha posição, concentrado no jogo, mesmo que alguém não tenha mais assunto para escrever num post senão expor um erro ortográfico meu ou achar que a equipa em que jogo não tem mais razões com que se envaidecer senão com uma simpática brincadeira de outro blog.
Com um pouco de sorte, o Joseph Blatter ainda me dá o prémio fair-play.
AB
PS: Aos iventoais intereçados, deicho aqui esta fraze. Com alguma imajinassão, conceguem faser dela um blog imteiro.

Omar Khayyam 

XV- Para lá dos limites da Terra, para lá dos limites do Infinito, procurava eu o Céu e o Inferno. Mas uma voz séria avisou-me: “ O Céu e o Inferno estão em ti”.

XLI- Renuncia à recompensa que merecias. Sê feliz. Não te lamentes nunca. Não anseies por nada. O que te há-de suceder está escrito no Livro que folheia ao acaso o vento da Eternidade.

LII- Se semeaste no teu coração a semente do Amor, então a tua vida não foi inútil.
Tão pouco o foi se tentaste escutar a voz de Deus. E, muito menos, se com um leve sorriso fizeste um brinde ao prazer.


CMC

Rubaiyat, Omar Khayyam

Piadola gratuita 

Os Santos & Pecadores cancelaram um concerto da sua digressão nacional. Parece que Olavo Bilac ficou rouco. LFB

O flagelo conhecido como "síndrome do amigo especial" 

Conversa gravada com um amigo não identificável:

- Então? Falaste com ela?
- Sim, diz que nunca conheceu alguém como tu.
- A sério?!
- Diz que és querido, divertido, inteligente... que só é pena ainda estar apaixonada pelo Abel. Mas soube-lhe mesmo bem falar contigo.
- O... o quê?! Ela ainda está apaixon... mas é que eu... eu pensava qu... não percebo...
- Diz que és o homem mais incrível que já conheceu.
- Eu não quero ser incrível! Eu quero foder! LFB

segunda-feira, agosto 18, 2003

Invejo o De Niro no Heat 

Porque no filme Heat, o Robert De Niro interpretava um ladrão que tinha esta máxima: "não te prendas a nada que não possas abandonar em 30 segundos". Porque eu pensei essa máxima, usando muito mais palavras, quando tinha 16 anos. Porque agora, 10 anos depois, percebo que não há nada que eu consiga abandonar em 30 segundos. A minha filha que adoro, a minha mulher que amo, a minha família que abraço, o tabaco que fumo, os almoços em restaurantes que me rebentam com o orçamento, o café do senhor Óscar que tomo todas as manhãs, os jornais que folheio, todos os livros que já li mas mesmo assim quero ter perto de mim, todos os livros que não vou ler mas mesmo assim quero ter perto de mim, os móveis da casa que ajudei a escolher, os azulejos cor de canela da cozinha, o serviço de chá, o gato preto que se mudou para o nosso apartamento há uma semana. Tudo isto são coisas que, hoje, não quero abandonar, por muitos sonhos que tivesse aos 16 anos. No entanto, há coisas que quero abandonar. Hoje abandono um lugar que habito há três anos e as pessoas que o habitam também. Invejo o De Niro porque ele demorava apenas 30 segundos. É o tempo certo para um abandono. TR

A guerra literária americana 

Havia decidido interromper a senda de autores norte-americanos para voltar a ler qualquer coisa escrita de Miami para baixo. Tendo gostado daquele que, penso, fosse o seu primeiro livro, Doce Companhia, agarro no segundo de Laura Restrepo, O Leopardo Ao Sol. O resultado final não é mau (em vários momentos, aliás, é bastante interessante), mas já cansa demasiado ler sucedâneos de Garcia Márquez. Será que os sul-americanos não são mesmo capazes de encontrar outra referência? Ou de deixar, pelos menos, os princípios para um novo imaginário? Leopardo ao sol é uma metáfora da morte, a morte que jaz no deserto como um leopardo estendido ao sol e a narrativa desenrola a história de duas famílias rivais do submundo colombiano, desavindas a partir do assassinato acidental de um dos patriarcas pelo outro, destinadas, agora, a aniquilar-se mutuamente até ao fim dos tempos...
Até pode parecer atractivo, mas, se não se importam, regresso aos americanos do norte. Com muito Auster.
AB

Lição sobre a condição humana numa discoteca terceirense 

A melhor discoteca dos Açores, WOLF, foi inaugurada na 5ª feira passada. Entre os convidados estavam 4 bailarinas do Queens. Obviamente, 4 belas moçoilas. Agora reparem: estas raparigas são pagas para dançar perante centenas de homens, várias noites por semana, já ouviram todo o tipo de pick-up lines, mas há sempre meia dúzia de indivíduos que acreditam que "sim, é a mim que ela vai dar atenção!". Sempre que sou assaltado com dúvidas sobre a lição que aprendemos com a História - a de que esta tem o hábito de repetir-se - penso nestes mártires. Não há nada tão fidedigno como a estupidez natural. LFB

Uma canção infantil timorense 

Não vamos poder contar aqui no DC com Mário Cabral. O seu nome esteve este tempo todo no cabeçalho porque tive esperança de o convencer a colaborar quando terminasse a tese de doutoramento. Mas agora, a partir de Setembro, o Mário, filósofo, professor e poeta, vai ser o novo responsável pela programação do Centro Cultural de Angra do Heroísmo. Talvez possamos ter, de quando em vez, uns textos dele.
Não havendo, faço então um post sobre o Mário – um dos John Keating’s da minha adolescência – recordando o tempo em que fazíamos um programa de rádio nos Açores, chamado “Projecto Governamental”, onde o Mário se emocionou lendo poemas seus dedicados ao pai falecido (antes de vir o ano em que a Pedra Formosa e o Campo das Letras o editaram) e, em plena luta timorense, cantou à capela, de microfone na mão, uma canção infantil timorense sobre uma menina das montanhas que perdeu a sua tartaruga mas descobriu o mar. LFB

domingo, agosto 17, 2003

Fight Club 

Não percebo as pessoas que censuram eventuais cenas de porrada devido a discórdias na blogoesfera. Há coisas que só se resolvem à porrada ou então Deus não teria dado a matraca a Bruce Lee. Andar à pancada é um direito que assiste a cada cidadão. O direito de resposta pode muito bem ser um murro nos queixos. Porque há palavras que doem mais que biqueiros no nariz. Trust me. LFB

CONACULTA 

É a sigla para o Conselho Nacional de Apoio à Cultura mexicano. Os únicos poemas que tenho editados estão num livro feito com ajuda desta instituição. E andei eu toda a vida a procurá-las em bares e discotecas quando estavam nas entrelinhas da poesia! LFB

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